domingo, 12 de setembro de 2010

Memórias de uma manhã amarela

Por vezes cantei
a cantiga da memória.
Relicários doces
dos quais se omitiu,
ou mesmo eu não deixei
claro nos descaminhos
sobre o suor que me escorreu.

Por mais que tente
não há carinhos
nem malícias
que enxugue a têmpora
do brilho acre,
do ser sozinho.
Há sempre a tentativa torpe
e desmedida de resgatar o tempo,
de relembrar a história.

Ecos no escuro
nossos amores e desafetos
beijos e socos detrás os muros.
Mil vozes rezaram em uníssono
rogando o seu retorno.
De volta, apenas meu grito estridente,
cheio de dor entre os dentes,
amanhecendo o transtorno.

E você, de vestidinho claro
leve e solto ao vento
comia, sem alento,
as sobras de um sem fim,
sem rumo.

Mas o teu coração...Ah o teu coração!
Esse não soluçava como o meu.
Tu corrias com sorriso nos olhos,
saciada e plena,
eras livre sem mim.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Caminhos

O cheiro de poeira
E a correr, a estrada.
É o vento na viseira
E os trilhos na madrugada.
Sou filho da terra.
Meu corpo a ela pertence.
A porteira se estende
E vou subindo a Serra.
Passando por caminhos tortos
Sigo em frente,
De casa em casa,
Com o frio entre os dentes.
Indo embora,
Asfalto e chão.
Hoje, lá fora,
Uma canção
Sobre a brisa,
Sobre seguir o tempo
E levar a vida
Em passatempo.

O gosto doce das matas
E o suor que escorre
Nos rios,
Tudo isso me ocorre
Em meus caminhos.
É bem verdade
Que ainda não vi tudo,
Mas a minha vaidade
É que não me contento.
A vontade de não ver tudo
Na realidade é meu alento.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Naquela nova vida

Necessito
nascer
novamente
naquela
noite
nem
notei
nossa
notória
[saudade...
naquele

nascia
nosso
novelo
na verdade
nubentes
negados
num
nocivo
[ desdém...
numa
nua
negação
no
ninho
nivelava
nossas
necessidades.
Não havia
néctar
nem
nácar.
Não nascia
nem mesmo
novilho,
nulo
nesse
nódulo
nascido
[num acaso.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Se foi

Saiu
sem
saber
se
seria
seu sopro
[no coração...
selou
sua
solidão
sem
soltar
som

sobras
[e comoção...
sabia
salvar
seu
salto
sem
sol
em salmoura
[na bacia
sem
sobressaltos
saltou
sua
séria
sabedoria
sacrificou
sem
saber
se seriam
sobras
seu suave gesto
sem gosto
sem graça
[se foi....

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Fora do ritmo

O desânimo se instalou!
Estou com preguiça de mim!
A paciência resvalou
e foi parar em Berlim!
O tempo de rimar
já vai acabar
e logo que soar,
o sino marcará
o fim.
E o começo do meu retorno
à casa boa, sem transtorno,
me dirijo, enfim.

As horas que passei
sem nem olhar para o mestre
e de ensinamentos que nem lembrei,
será que ele sabe que eu sei?
Vai ditar minhas notas
essas não soam bem,
nem sei mesmo como tocam
os acordes que me vem.
Se o seu papel é não deixar eu seguir,
eu lhe garanto que o meu
é confundir!
Brincar com palavras
zombeteiro que sou
vou falar de trevas
e você me dirá que errou.

Mas acalma-te afinal,
pois aqui jaz um desabafo
e a minha poesia é um blefe.
O poeta está cansado, mas é safo!
Vá pra casa e descanse,
pense bem e não saboteie.
Posso não fazer que te lances
mas no fim, enlouqueça!

domingo, 27 de junho de 2010

fumando janelas.

A dor do cigarro que trago
amargo, espreitando à noite
janelas acesas, pelas grades vejo.
O chiado mudo que escuto,
criada a confusão
que retumba em meu pulmão.
Respiro pior
mas, mais atento
à fumaça, me acalento.

É como o vento a açoitar
o vidro delicado
que geme e sussurra
o corpo que se esmurra
num gesto desdenhado
o fumo dobrado.

Fechou-se a cortina!
Mas a janela ganhou novos contornos,
já que a luz ainda margeia
e o brilho permeia
e o alumínio parece adorno.

O cigarro se apagou
e ainda estou acordado.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Mandacaru

"Que me perdoe a sinceridade,
meu caro conhecido,
que apesar da idade
tem lassos sinais de cansaço
e ainda gurada mocidade,
mas, seu juvenil gesto de amor
de louvar seu doce mandacaru em flor,
não é o verdadeiro sinal
daquele ímpeto frugal,
dos que se iniciam com ardor.

É o mandacaru em fruto
com sua viscosidade
e aspecto carnal
com que os recém-rapazes
se mostram sagazes
e prontos para a rima
desconcertada e temida
que jacente está em mandacaru:

Linda e jovem flor de mandacaru,
é teu fruto o que eu quero,
e não teu amor sincero,
me dá logo o seu ...."

Férias de verão

Dedico aos meus amigos Flávio, Érika e Tia Fá.

De súbito, ressuscitam memórias
de um tempo bom.
Daquelas velhas glórias,
de jovens à toa e pé no chão.

Pés tortos, numa saia de baiana,
com riso e deboche.
Noites à dentro, vela a derreter,
idéias, sonhos e nada de cama.

E no teatro às escadas,
escorregam gargalhadas,
erro e pó de imaginação.
E o sopro com a mão no queixo,
fez passar voando,
como em um turbilhão,
como que com desleixo.

Imagens, que se passam
faces que marcaram,
o trevo, a Ana
e a água da cana.

Ah! E o moço do cruzeiro
com rabo de gato,
cabeça de máquina de escrever...
é tanta coisa
que faz renascer
o desejo de voltar àquelas tardes
à porta da casa
esperando as estrelas,
procurando seres de outros planetas.
Ou mesmo achando tê-los achado,
ao avistar um Balão de São João.
E assim se passavam os dias,
todos os dias, em minhas férias de verão.